Na Casa dos Cinquenta
'And just like that' tem problemas, mas também acertos importantes e preserva o que importa. Mostra que a Casa dos Cinquenta pode ser bem movimentada, inclusive com glamour e sexo.
Não é que eu goste mais de And just like that do que de Sex & city. Mas a identificação com personagens e situações acontece em tempo real, estamos exatamente na mesma faixa etária (de Gaza), na mesma Casa do Cinquenta1 , vivendo coisas semelhantes. Na época da série original - que eu comecei a ver quando deixou de ser cult e já era pop - meu estado civil era casada-com-filho-pequeno. Então as aventuras daquelas mulheres-solteiras-procuram eram divertidas, mas fora da minha realidade. Uma vida que perdi antes de chegar a ter, na verdade.
Agora não: eu estabeleço simetrias imediatas com aquelas mulheres e suas amigas (apesar da abissal diferença minha conta bancária e as delas). A amiga que perde o companheiro, o casamento que implode, dilemas com filhos, as vicissitudes e os ganhos do envelhecimento, velhos novos amores, maior e menor familiaridade com novas tecnologias. Todo um universo de questões interessantes tratadas com a leveza que exige uma série televisiva e com uma diversidade inexistente no original.
A série tem defeitos, óbvio. Na temporada que terminou semana passada achei os obstáculos no relacionamento do Tony meio irreais e o tratamento dado grosseiro, como umas piadinhas bem constrangedoras, pueris. Mas esse foi um plot em meio a vários outros bem trabalhados, como a emancipação de Charlotte, e o capítulo que trouxe de volta Candice Bergen para discutir etarismo — com o auxílio luxuoso de ninguém menos que Gloria Steinem.
Fico incomodada com o que percebo como certa implicância com a série, parece que agora é cool não gostar de AJLT como era regra gostar de SATC. Ou as pessoas se apegam demasiadamente aos erros, ou consideram muito superficial - como se a original tivesse sido um drama de cinco temporadas - ou, o que me parece mais grave, dizem que falta o glamour, o charme da série original — e eu percebo o etarismo escorrendo no canto da boca. Bem, essas mulheres estão 20, 25 anos mais vividas, se você esperava encontrar a mesma série, esperou errado.
O maior desafio de AJLT, pra mim, é desenvolver bem um número maior de personagens e arcos dramáticos - nessa temporada, por exemplo, queria ter mais da profa. Naya; a suspeita de romance entre Lili e Brady ficou esquecida. Mas o coração da série, o fio condutor da história, que é a profunda amizade entre um grupo de mulheres, esse está lá desde o início e nos dá a ideia de que permanecerá, para além de casamentos, mortes e até mesmo de possíveis desentendimentos - Samantha se faz presente de um jeito ou de outro, não só para a Última Ceia, mas desde a primeira cena da primeira temporada (superando até as rusgas entre suas intérpretes). É (e sempre foi) sobre isso.
Achei aqui no Substack a news de uma jornalista americana que chama nós mulheres de +50 de Queenagers, porque estamos, de certa forma, adolescendo nessa fase da vida em que nos tornamos as queens que queremos ser. Tem conteúdos interessantes, vale a pena dar uma olhada.
Queenager | kween·ay·jer | noun 1. whatever you want it to be.
Helê
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E por falar em ser quem a gente quiser, esta semana li um livro levinho, gostosinho, chamado A Biblioteca da Meia-Noite. Conta a história de uma moça não muito jovem (mas também não muito velha) que se sente medíocre e fracassada e, ao se ver num lugar entre a vida e a morte, consegue experimentar vidas alternativas — sabe aquelas vezes que a gente se pergunta “e se eu tivesse feito isso e não aquilo”? O livro é sobre isso. Uma viagem bem interessante por possibilidades que foram sem nunca ter sido.
-Monix-
eu na minha habitual blissful ignorance não fazia ideia de que era cool não gostar da série.... E estou amando, muito mais do que Sex And The City (que eu aliás nunca amei-amei). Comecei a ver por curiosidade meio profissional, eu traduzi muito a primeira e queria ver se o roteiro continuava bacana, e caí de amores, me identifiquei demais. Só não tinha me dado conta da coisa sobre a fase de vida lá das moças solteiras, faz todo sentido... :)